27/04/2008

Uma Religião chamada Umbanda


"Histórico Africano"
Os primeiros escravos que aqui chegaram vinham da região da Guiné Portuguesa e foram distribuídos pelas áreas dos canaviais da Bahia e de Pernambuco, alem de outros Estados. Também utilizados nas culturas de cana foram os de língua banto, originários de Angola e do Congo. Já para a área da mineração foi maior a influencia de negros oriundos do litoral da Costa de Mina - os nagôs, os jêjes e outros.
Estes negros trouxeram consigo uma grande bagagem mística, diversificada em varias tendências. Nina Rodrigues coloca, no entanto, que os cultos que aqui se estabeleceram e se organizaram tiveram como principal modelo à religião dos nagôs. A inacessibilidade da mensagem católica fez com que se apegassem as suas origens religiosas. O exclusivismo nagô, asseverado por Nina Rodrigues, sofre restrições por parte de outros autores, devido à constatação da relevância, ate hoje, de elementos religiosos de outras raízes, como, por exemplo, os oriundos do Congo e Angola. Por outro lado, vem ocorrendo, desde o fim do trafico negreiro, um acentuado processo de nacionalização dos cultos. A gradativa introdução de novos estereótipos contribui cada vez mais para a diversificação em varias seitas, e destas em vários subtipos. Edson Carneiro tem uma colocação especifica sobre o tema. Para ele, a manutenção da diversificação das religiões dos negros foi incentivada por certas autoridades do século XIX. Já que o único falar de desunião entre os negros era a diferença religiosa, uni-los neste sentido seria fortalecê-los.
A primitiva localização dos escravos no território brasileiro sofreu modificações por forca do desenvolvimento histórico, tanto econômico como político. Fatores como a guerra contra os holandeses, os quilombos, as insurreições dos negros e as revoluções de independência provocaram enorme dispersão dos negros e difusão de sua cultura. Os ciclos econômicos, principalmente, demandando mais braços para novas regiões, possibilitaram o intercambio lingüísticos, sexuais e religiosos entre escravos e nativos. Mas, para Nina Rodrigues, prevaleceu à religião dos nagôs (cultura Yorubá - ades), tomada como padrão pelas demais religiões afro-brasileiras. Estas podiam, então, ser distinguidas segundo o maior ou menor grau de absorção de elementos nacionais (sincretismo cultural e religioso - ades). A proeminência da contribuição nagô, segundo e colocado por Nina Rodrigues, adejem de sua posição social originaria, na África, e de sua constituição, aqui, numa espécie de elite que se impunha. Sua localização inicialmente na Bahia e Pernambuco fez com que estas regiões se tornassem pólos de irradiação do modelo nagô para o Nordeste e Centro-Sul.
Entretanto, as características sociais, geográficas e econômicas de Minas, Rio e São Paulo colocaram impasses a imposição de tal modelo (Além disso, essas regiões receberam negros originários de Angola, do Congo, Moçambique, Cambinda,..., com cultura Bantu e de língua e dialetos Quimbundo, diferenciando-se da cultura Nagô, tanto em relação às divindades, inkices - similares aos Orixás Nagôs, quanto no culto aos antepassados - não utilizado dentro da cultura Nagô, o que muito influenciou diversas formas de Umbanda - ades). A massa escrava destes centros vinculava-se a formas de expressões religiosas "fincadas na região ha mais de cem anos".
É importante notar o que nos diz Edson Carneiro: "Uma coisa que merece destaque é verificar que todos os cultos ou quase todos funcionaram no quadro urbano, com pequenas exceções no quadro rural. Isto porque, no quadro rural o escravo não podia manter o culto organizado. Para isso ele precisava de dinheiro e liberdade, e isto ele só viria a ter nos centros urbanos". É assim que eles fundaram na primeira metade do século XVIII as Irmandades do Rosário e de São Benedito sob a orientação dos seus senhores. Foi enfrentando um período de repressão que se estendeu ate 1822, quando ocorre à fundação do Candomblé de Engenho Velho, na Bahia (1830) - inicio da fase do culto organizado.
Como foi mencionado anteriormente; vários fatores se interpuseram à fixação do modelo nagô na região que compreende Rio e São Paulo. Logo de inicio, esta região recebeu maior número de africanos originários de Angola e Congo, os de língua banto. Os primeiros cultos começaram a se difundir por volta de 1763. Com a designação de macumba experimentaram certo período de resplendor que se apagou no inicio deste século. Debilitaram-se com as concessões feitas às tradições culturais de Angola. Assim é que passaram a adotar danças semi-religiosas (gongo e o caxaruin - ades) e o culto dos mortos.
A adesão de novos brasileiros fortaleceu a absorção de elementos nacionais, desenvolvendo-se, assim, praticas espiritistas e ocultistas ao lado de novas divindades caboclas e negras (já podem ser vistas manifestações de guias, entidades, como pretos-velhos, caboclos, exus - ades).

O processo sincrético que deu origem a Umbanda desenvolveu-se em etapas históricas:
Primeira: Africana ou básica -> resultado da sedimentação de contribuições árabes, egípcias, semíticas, etc., formando os cultos básicos das nações que nos forneceram escravos (uma linha de culto mais voltada às origens africanas, como o culto aos orixás e sua incorporação; utilização do corte ritual; da feitura; de atabaques; bebidas; guias - colares; contos cantados com uma mescla de português e Yorubá e ou Quimbundo; utilização de ervas para banhos, defumações, cura...).
Segunda: Indígena -> os negros que se internavam nas matas, principalmente os de origem banto identificam-se com o que havia de semelhante nos cultos dos indígenas.
Terceiro: Européia ou católica -> os negros e índios, incapazes de assimilar in toctuma a religião católica que lhes era imposta pelos padres, fizeram-no imperfeita ou parcialmente no que havia de correspondência com suas divindades tradicionais (Sincretismo afro-católico na associação dos Orixás africanos aos santos da igreja. Vemos que o sincretismo afro-catolico permitiu a introdução das palavras de moral e fé deixadas por Jesus Cristo - sincretizado como Oxalá. Podemos também observar que casas sincréticas utilizam o Pai nosso, Ave Maria, o Credo, uso da cruz como símbolo de força e ligação entre o mundo material e o espiritual).
Quarta: Espiritista -> após a libertação dos escravos vemos a integração do seu culto ao culto espiritista que se difundia entre as elites brasileiras desde 1873 (Podemos ver que casa com essa influencia não utilizam o sincretismo, imagens, o culto aos Orixás, não utilizam bebidas ou fumos, não utilizam atabaques e muitas não trabalham com Exus. Por vezes vemos os trabalhos realizados nessas ramificações por meio de uma mesa onde as entidades descem para dar sua orientação e trabalho. Muito parecido ou como se fosse uma copia dos trabalhos espíritas tradicionais).
Quinta: Orientais -> introdução de conceitos e identificação com o Oriente na busca de uma tradição mais antiga. Como uma forma de legitimar ou consagrar a religião por uma associação de formas e ritos semelhantes, mas com cunho culturais divergentes - ades.
Sexta: Esotérica e Ocultismo -> primeira metade do séc. XX autores umbandistas mesclam as formas tradicionais de magia africana com praticas no esoterismo teosófico iniciado com Helena Petrovna Blavatsky (1831-1891) mais conhecida como Madame Blavatsky, uma das co-fundadoras da Sociedade Teosófica em Nova Iorque em 1875. A tradição teosófica esotérica de Blavatsky vai beber de várias tradições filosóficas e religiosas: Zoroastrismo, Hinduismo, Gnosticismo, Maniqueísmo, a Cabala, entre outras - ades.
Dai começa, então a se formar um novo culto; que se distancia dos candomblés da Bahia. Artur Ramos chamou este novo produto de "jeje-nago-mussulmi-banto-caboclo-espirita-catolico" e onde cada um contribuiu com uma parte.
Por sua vez Edson Carneiro assevera que "em nenhuma outra área os cultos de origem africana se apresentaram em tão adiantado estagio de nacionalização. A cambando para a nacionalização, ainda não terminada, passou, primeiro, Dela grande etapa de tradução das crenças jeje-nago em termos angolenses (nação que predominava na região de Rio e São Paulo) e, em segundo, pelas etapas do ocultismo e, espiritismo, estruturas fiéis do pensamento em que se apoiou a nova religião nos anos de intolerância".
A nova religião que se derivou deste processo sincrético obteve varias denominações. Em Angola, dava-se o nome de Mbanda ao sacerdote, e ao invocador de espíritos, Ki-Mbanda. Desta forma, em principio, Umbanda queria dizer sacerdote; depois, por extensão, passou a designar "local de culto", e, finalmente, para nos, brasileiros, a religião.
Em 1894, através da palavra de Hely Chanterlain encontramos o registro dos termos com o seu significado e derivação - ades. Partindo dai, a macumba-mista do Rio de Janeiro, produto sincrético de praticas espíritas, culto dos orixás e magia européia, foi aos poucos tendendo para a denominação de Umbanda. Para Edson Carneiro existe uma diferença básica entre a Umbanda e a Macumba, e ambas sobrevivem lado a lado. "As confrarias, chamadas a principio macumbas, compreendiam a linguagem mágica dos tambores e a possessão da divindade de acordo com o modelo original - é por isso se viram expulsas do perímetro urbano carioca; as sucessoras, ou aquelas que se adaptaram as novas exigências policiais, passaram a chamar-se Umbanda, suprimindo os tambores e moderando a possessão".

O primeiro Congresso Umbandista realizou-se no Rio de Janeiro em 1941, visando estruturar uma pratica religiosa, o que já se fazia ha mais de trinta anos, desordenadamente. Nele fará delimitados os elementos de cujo sincretismo surgiu a Umbanda nas suas diversas apresentações, já que não ha uma unidade doutrinaria e ritual é justamente o objetivo de seus órgãos de cúpula tentar tal unificação para o maior fortalecimento da seita (Porém não deu certo, pois não se discutia a visão da religião em seu todo, mas segmento impondo verdades, ritos, formas e culto a sua maneira. A grande contribuição foi à formação de mais Federações com o intuito de proteger os trabalhos e a identidade dos que praticavam - ades).

Atualmente a Umbanda surge como um fenômeno social de maior importância, dado seu crescente predomínio... Já conta atualmente, no Grande Rio, com centenas de terreiros adeptos, o que a coloca na situação de religião prevista pelos estudiosos como a que deverá predominar daqui a alguns anos.
A pesar da tradição africana, a Umbanda pode ser considerada essencialmente brasileira. Os santos se adaptam ao ambiente. Usa-se uma linguagem direta e compreensível. Os cultos africanos podem servir de modelo no que se refere à comunicação.
Tal adaptação explica o sucesso do crescimento da Umbanda. Alem disso, o crescimento da Umbanda no Grande Rio prende-se, sobretudo, aos anseios populares que encontram nesta religião uma identificação imediata, principalmente nas camadas mais baixas da sociedade (uma ressalva: pois além das camadas mais baixas, a classe media e classe media alta também se encontram representadas em diversos segmentos - ades).

Para isso muito contribui:
a) o ritual, simples e direto. O médium adota a roupagem numa igualdade de condições com o ambiente (o ritual de Umbanda pode ser mais simples, mais complexo ou nem mesmo existir; tudo depende da formação da ramificação e suas praticas - ades);
b) comunicação simples e direta - o crente fala diretamente com a entidade, através de seu cavalo; sem maiores problemas e com muita simplicidade, o crente trata dos seus assuntos de forma espontânea e clara, numa linguagem de fácil compreensão (também é variável conforme a ramificação de Umbanda que se esteja estudando - ades);
c) o imediatismo - a possibilidade de resolver seus problemas em curto prazo;
d) o sincretismo religioso - o que contribui positivamente para que seja cada vez maior o numero de adeptos aos cultos umbandistas. Através dos caboclos, pretos-velhos e exus, observa-se uma integração das religiões, cujos resultados poderão ser benéficos para os que buscam a Umbanda como um cordão extensivo da religião católica, que ainda respeitam e acreditam, mas que dela se distanciam cada vez mais (da mesma forma aqueles que praticam o espiritismo, mas se sentem presos a uma forma rebuscada e intelectualizada, acham em diversas formas de Umbanda uma linguagem mais simples e humilde - ades);
e) a mística, extremamente simples e de poesia singela, atinge diretamente o sentimento do povo (ou uma mística mais complexa envolvendo elementos teosófico e cabalísticos altamente elaborados - ades);
f) Os instrumentos são de percussão e o ritmo vibrante marca todo o culto (varia conforme a origem da ramificação; não são todas que adotam o uso de instrumentos de percussão - ades);
g) a facilidade de se entrar em contato com a religião, para se fazer à cerimônia religiosa.

Frei Boaventura dá a sua posição católica, com referencia a Umbanda, afirmando que: "é o movimento mais popular religiosamente, ao lado do pentecostismo, sobretudo entre a grande massa suburbana, e começa a penetrar as zonas rurais e atinge também as populações de origem européia. Pode-se dizer que boa parte dos freqüentadores (e dirigentes) é branca, inclusive das classes sociais mais privilegiadas".
Para ele, a impressão é de "estar diante de um fenômeno de violenta irrupção de uma religiosidade insatisfeita com as formas religiosas oficiais e rígidas, excessivamente controladas e frias, demasiadamente complexas e intelectualizadas, que não dão suficiente atenção às tendências e exigências profundas das peculiares formas culturais de um determinado povo e impedem a manifestação espontânea da alma religiosa popular".
A Umbanda, continua Frei Boaventura, "da a impressão de ser um protesto popular contra todas as formas importadas e insuficientemente adaptadas".
"(...) Devemos tentar valorizar positivamente os ritos, usos e costumes da religião umbandista no Brasil. Pode-se afirmar que a presença da Umbanda no Brasil é a presença da África Negra no Brasil".
Para aquele frade, "O homem negro é essencialmente religioso, cultural, simbólico, mítico, ritual, celebrante, vital, sapiencial, contemplativo, social e comunitário (Foi o que lhe deu sustento diante da escravidão, dos maus tratos, de ser tratado como coisa sem alma. Sem a religião, e sem ter uma forma de preservar sua cultura, o negro não teria sobrevivido - ades); que é fenômeno geral no negro africano a preocupação continua de se por em contato permanente com o mundo do além, o que o torna um ser estruturalmente religioso; e por isso sua cristianização para ser autêntica deve partir essencialmente deste pressuposto básico" (Ao contrário do que se pensa o negro não se curvou ao Cristianismo Católico, mas sim, o absorveu fazendo com que existisse, harmonicamente, com os Orixás e ancestrais oriundos da África. Não houve uma aculturação do negro à cultura do branco, mas uma adaptação das necessidades religiosas Africanas à religiosidade imposta pelo branco - ades).
Finaliza ele, dizendo que "Devemos descobrir com alegria e respeito às sementes ocultas do Verbo nas culturas africanas. Contudo a Umbanda não é tradição africana e sim um curioso sincretismo de elementos africanos, ameríndios, espirituais e..." (Da mesma maneira que a maioria das grandes religiões também têm seu sincretismo, variado e diverso dentro de lutas culturais e apropriações históricas, na Umbanda não poderia ser diferente - ades).
Retirado do livro Rituais Negros e Caboclos, Nivio Ramos Sales, Ed. Pallas.
Com alguns adendos meus: ades (adendo de Etiene Sales).





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